segunda-feira, 9 de junho de 2025

por causa do vento
mastigamos areia -
o sal pousou em nossas bocas
para não precisarmos
beber do mar.

por causa da areia
nossos pés afundavam
e porque nos arrastávamos lentamente
tivemos a chance de ficar em silêncio
muito tempo
ouvindo apenas o trêmulo
calor do teu corpo

porque irias embora
após a última música
te levei para ouvir o minueto
das ondas
"vamos nos despedir quando
o mar fizer silêncio",
eu disse

"eu não vou ficar para sempre",
tu disseste
e eu respondi "shh --
estás perdendo a melhor parte"

naquela noite
nossas preocupações cabiam
numa concha de berbigão
porque o mundo cabe
numa concha de berbigão

depois o milagre:
o primeiro fio do sol
alisou o horizonte
e calou o mar

no espelho que sobrou
afundaste para nunca mais
voltar..